News Farma (NF) | Quais os possíveis tratamentos de combate à tuberculose?
Dr.ª Maria da Conceição Gomes (MCG) | A tuberculose é uma doença complexa, mas com cura. Geralmente esta doença é associada apenas aos mais excluídos socialmente e às pessoas com múltiplas doenças, o que não é verdade. É uma doença que nos pode afetar a todos, mas que tem tratamento. Há muitos anos, a doença estava ligada à morte, mas desde os anos 50 que esse estigma foi desaparecendo, à medida que surgiram tratamentos eficazes. O tratamento consiste na toma de comprimidos e, excecionalmente, injeções, em regime de toma diária durante, no mínimo, seis meses. Os centros de diagnóstico pneumológico e as consultas de tuberculose mantiveram o seu funcionamento em regime de porta aberta, mesmo durante toda a pandemia de COVID. O Plano Nacional da Tuberculose e os Planos Regionais de Tuberculose têm desenvolvido esforços eficazes no controlo da tuberculose em Portugal.
NF | Tem existido uma evolução nos estudos clínicos para permitir uma atualização nos tratamentos da tuberculose?
Dr.ª Joana Carvalho (JC) | Sim, tem existido uma evolução. A maioria dos tratamentos da tuberculose teve origem nos anos 50/60, sendo que o esquema terapêutico atual se encontra estabelecido desde a década de 80. Ainda assim, tem existido investigação farmacológica e laboratorial no âmbito da tuberculose, sobretudo pela emergência de estirpes resistentes que dificultam o tratamento.
Na última década, surgiram três novos fármacos de segunda linha para o tratamento da tuberculose multirresistente. Têm também sido desenvolvidos estudos para tentar encurtar a duração do esquema terapêutico através da utilização de fármacos em doses mais elevadas, porque o tratamento é prolongado ao longo de muitos meses, o que pode constituir um obstáculo à adesão. Está também prevista a comercialização de uma nova vacina a curto prazo.
NF | Nos últimos anos, qual a evolução dos casos em Portugal?
JC | Temos assistido a uma diminuição sustentada dos novos casos de tuberculose em Portugal ao longo dos últimos anos. De acordo com os dados do último relatório anual de vigilância e monitorização da tuberculose em Portugal (dados definitivos de 2020) – DGS, a taxa de incidência de tuberculose em Portugal situa-se atualmente nos 14.2 casos/100.000 habitantes, o que corresponde a 1357 novos casos e 108 retratamentos. Nos grandes centros urbanos, em Lisboa e no Porto, a incidência é maior.
Este declínio deve-se ao esforço combinado dos programas nacional e regionais para a tuberculose e dos profissionais no terreno no rastreio, prevenção e tratamento da doença.
NF | Os doentes são diagnosticados numa fase precoce ou mais avançada da doença?
MCG | Os sintomas iniciais da tuberculose são muito inespecíficos e compatíveis com várias doenças. Tendo existido um declínio constante na sua incidência, pensamos pouco na tuberculose. Isto é verdade tanto para os doentes como para os profissionais de saúde, o que leva a um atraso no diagnóstico. Neste sentido, estamos a incentivar um aumento da literacia em tuberculose para todos (sociedade civil e profissionais de saúde).
NF | Uma maior divulgação pode ajudar nas fases de diagnóstico e de tratamento da tuberculose?
MCG | A divulgação vai ajudar ao diagnóstico precoce e permitir uma instituição mais rápida do tratamento, com menos sequelas a longo prazo. Por outro lado, o diagnóstico precoce, sobretudo na tuberculose das vias respiratórias (laríngea, pulmonar), permite a diminuição do contágio, uma vez que nestes casos existe uma transmissão por via aérea do bacilo de Koch. A tuberculose existe, tem cura e temos de nos lembrar desta doença quando temos sintomas respiratórios ou muito cansaço.
NF | Que mensagem a Comissão de Tuberculose da SPP gostaria de deixar para este Dia Mundial do Combate à Tuberculose?
JC | Temos de desmistificar a tuberculose. É uma doença prevenível, mas temos de estar sensibilizados para ela. As medidas de prevenção, como a etiqueta respiratória, devem estar em mente relativamente à sua transmissão. É uma doença tratável, com cura, que pode atingir qualquer pessoa. Não é uma doença só de grupos minoritários, nem é uma doença da pobreza.